Cirurgia de hérnia e lesão acidental na bexiga: parede do saco herniário colada à parede vesical. Complicação, prevista na literatura médica, foi adequadamente tratada. 15.11.2019 • por Diego Mariante Cardoso

Paciente pediátrico, com menos de seis meses de idade, que apresentava hérnia inguinal, submeteu-se a cirurgia para correção do quadro. O ato cirúrgico transcorreu dentro da rotina, ocorrendo apenas uma intercorrência própria do quadro sob operação: a bexiga estava fazendo parte do saco da hérnia, significa dizer que se fundiram os tecidos destas estruturas. Por isso, durante a dissecação cirúrgica para o tratamento adequado da hérnia houve incisão na parede da bexiga. Esta complicação é conhecida em se tratando de hérnia inguinal, principalmente em crianças da referida faixa etária, sendo tratada com larga casuística na literatura médica – a qual preconiza que, produzida a incisão na parede da bexiga, o procedimento adequado é suturá-la em dois planos e colocar sondagem para que a urina saia pela sonda (cateter) uretral (através da uretra até a bexiga), visando impedir a distensão do reservatório musculomembranoso e possibilitando a cicatrização, o que foi feito. Também foi posto dreno a fim de identificar possível falha na cicatrização, isto como cautela. Assim, a lesão ocorrida constitui risco inerente à cirurgia e de fácil e repetitiva solução, isto é, sutura do tecido — o que é corrente na atividade cirúrgica — e colocação de cateter ou sonda vesical. Feita a cirurgia, permaneceu internado o paciente, com a sonda vesical, para que houvesse a cicatrização necessária. Depois de alguns dias, frente à não cicatrização da bexiga, foi chamado outro médico, com dedicação na área de urologia pediátrica, que examinou o paciente e decidiu por nova cirurgia para ressutura da bexiga e drenagem por cistostomia (cateter ou sonda do interior da bexiga saindo pela parede abdominal). O problema apresentado, então, era de cicatrização e não decorrente da primeira cirurgia. Após este momento, o paciente precisou sofrer diversos outros procedimentos para solucionar o quadro originado pela dificuldade de cicatrização.

O paciente, representado por seus familiares, ingressou em juízo contra o médico que realizou a primeira cirurgia, alegando má-prática profissional, e requerendo indenização por danos materiais e morais. O médico apresentou defesa no processo, aludindo os fatos conforme narrados. Após extensa produção de provas, demonstrou-se que o ponto de vista da defesa era correto. O acórdão (decisão de segunda instância), em julgamento pelo  Tribunal de Justiça, assim descreveu a matéria, conforme o seguinte excerto de dita decisão, referindo-se à perícia realizada: “Em resumo, não atestou o ‘expert’ ter agido culposamente o médico demandado, já que concluiu que o tratamento ministrado ao autor-paciente era condizente com as circunstâncias do caso concreto, com os riscos aceitáveis, com a boa técnica, sendo um risco da própria cirurgia (correção de hérnia inguinal) ministrada a eventual perfuração de parte da parede da bexiga. A partir de tal fato, insere-se que o organismo do autor não respondeu adequadamente aos cuidados ministrados, uma vez que a equipe médica tomou todas as providências cabíveis para que houvesse a eficaz solução do problema do paciente. Analisados os fatos e as respostas dos quesitos, chego a igual conclusão, não vendo motivo para responsabilizar o profissional da medicina demandado.” Assim, o processo foi julgado favoravelmente ao médico, negando-se os pedidos do paciente autor.